sexta-feira, 28 de outubro de 2011

O PERFEITO IMBECIL POLITICAMENTE INCORRETO

Foram poucos os artigos incluídos aqui no Blog Gramática do Mundo que não são de minha autoria. Mas às vezes me deparo com algumas opiniões expressas em blogs ou sites que tratam de temas que coincidem com a minha intenção de abordá-los. Para evitar repetições, ou até mesmo coincidências que dê a má impressão de cópias, prefiro citá-los aqui por inteiro. É o caso desse texto que os leitores encontrarão no site da revista Carta Capital. Esse livro, citado pela jornalista, tem suas idéias reproduzidas aqui no Brasil por uma troupe reacionária que ocupa as páginas de algumas revistase jornais que compõe o chamado PIG (Partido da Imprensa Golpista) e seus sabujos, que se caracterizaram por ridicularizar os avanços do Brasil nos últimos anos. Alguns, submetidos à inúmeros processos por calúnia e difamação preferem o auto-exílio e fogem para Nova Iorque, de preferência, outros continuam aqui arrotando seu direitismo no denuncismo lacerdista e o ódio mortal aos que preferem exaltar as belezas e características do nosso povo, bem como as idéias nacionalistas. São serviçais dos interesses estrangeiros em nosso país, inclusive no ataque à nossa cultura e aos valores simbólicos e imateriais do povo brasileiro.

 O perfeito imbecil politicamente incorreto(*)

Imagem (**)
No Brasil, é aquele sujeito que se sente no direito de ir contra as idéias mais progressistas e civilizadas possíveis em nome de uma pretensa independência de opinião. Saiba como reconhecê-lo.
Por Cynara Menezes.
http://www.cartacapital.com.br/politica/o-perfeito-imbecil-politicamente-incorreto

Em 1996, três jornalistas –entre eles o filho do Nobel de Literatura Mario Vargas Llosa, Álvaro –lançaram com estardalhaço o “Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano”. Com suas críticas às idéias de esquerda, o livro se tornaria uma espécie de bíblia do pensamento conservador no continente. Vivia-se o auge do deus mercado e a obra tinha como alvo o pensamento de esquerda, o protecionismo econômico e a crença no Estado como agente da justiça social. Quinze anos e duas crises econômicas mundiais depois, vemos quem de fato era o perfeito idiota.
Mas, quem diria, apesar de derrotado pela história, o Manual continua sendo não só a única referência intelectual do conservadorismo latino-americano como gerou filhos. No Brasil, é aquele sujeito que se sente no direito de ir contra as idéias mais progressistas e civilizadas possíveis em nome de uma pretensa independência de opinião que, no fundo, disfarça sua real ideologia e as lacunas em sua formação. Como de fato a obra de Álvaro e companhia marcou época, até como homenagem vamos chamá-los de “perfeitos imbecis politicamente incorretos”. Eles se dividem em três grupos:
1. o “pensador” imbecil politicamente incorreto: ataca líderes LGBTs (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Trânsgeneros) e defende homofóbicos sob o pretexto de salvaguardar a liberdade de expressão. Ataca a política de cotas baseado na idéia que propaga de que não existe racismo no Brasil. Além disso, ações afirmativas seriam “privilégios” que não condizem com uma sociedade em que há “oportunidades iguais para todos”. Defende as posições da Igreja Católica contra a legalização do aborto e ignora as denúncias de pedofilia entre o clero. Adora chamar socialistas de “anacrônicos” e os guerrilheiros que lutaram contra a ditadura de “terroristas”, mas apoia golpes de Estado “constitucionais”. Um torturado? “Apenas um idiota que se deixou apanhar.” Foge do debate de idéias como o diabo da cruz, optando por ridicularizar os adversários com apelidos tolos. Seu mote favorito é o combate à corrupção, mas os corruptos sempre estão do lado oposto ao seu. Prega o voto nulo para ocultar seu direitismo atávico. Em vez de se ocupar em escrever livros elogiando os próprios ídolos, prefere a fórmula dos guias que detonam os ídolos alheios –os de esquerda, claro. Sua principal característica é confundir inteligência com escrever e falar corretamente o português.
2. o comediante imbecil politicamente incorreto: sua visão de humor é a do bullying. Para ele não existe o humor físico de um Charles Chaplin ou Buster Keaton, ou o humor nonsense do Monty Python: o único humor possível é o que ri do próximo. Por “próximo”, leia-se pobres, negros, feios, gays, desdentados, gordos, deficientes mentais, tudo em nome da “liberdade de fazer rir.” Prega que não há limites para o humor, mas é uma falácia. O limite para este tipo de comediante é o bolso: só é admoestado pelos empregadores quando incomoda quem tem dinheiro e pode processá-los. Não é à toa que seus personagens sempre estão no ônibus ou no metrô, nunca num 4X4. Ri do office-boy e da doméstica, jamais do patrão. Iguala a classe política por baixo e não tem nenhum respeito pelas instituições: o Congresso? “Melhor seria atear fogo”. Diz-se defensor da democracia, mas adora repetir a “piada” de que sente saudades da ditadura. Sua principal característica é não ser engraçado.
3. o cidadão imbecil politicamente incorreto: não se sabe se é a causa ou o resultados dos dois anteriores, mas é, sem dúvida, o que dá mais tristeza entre os três. Sua visão de mundo pode ser resumida na frase “primeiro eu”. Não lhe importa a desigualdade social desde que ele esteja bem. O pobre para o cidadão imbecil é, antes de tudo, um incompetente. Portanto, que mal haveria em rir dele? Com a mulher e o negro é a mesma coisa: quem ganha menos é porque não fez por merecer. Gordos e feios, então, era melhor que nem existissem. Hahaha. Considera normal contar piadas racistas, principalmente diante de “amigos” negros, e fazer gozação com os subordinados, porque, afinal, é tudo brincadeira. É radicalmente contra o bolsa-família porque estimula uma “preguiça” que, segundo ele, todo pobre (sobretudo se for nordestino) possui correndo em seu sangue. Também é contrário a qualquer tipo de ação afirmativa: se a pessoa não conseguiu chegar lá, problema dela, não é ele que tem de “pagar o prejuízo”. Sua principal característica é não possuir ideias além das que propagam os “pensadores” e os comediantes imbecis politicamente incorretos.


(*) Extraído do site da Revista Carta Capital (conforme link acima)
(**) Imagem: http://www.cartacapital.com.br/politica/o-perfeito-imbecil-politicamente-incorreto/attachment/nelson

domingo, 23 de outubro de 2011

“MEU TEMPO É HOJE. EU NÃO VIVO NO PASSADO, O PASSADO VIVE EM MIM”

No final do ano de 2010 escrevi um artigo em que analisava toda a minha trajetória política, em 30 anos de militância, e praticamente encerrava minha participação na luta política, pelo menos com o nível de engajamento que eu me dedicara por tanto tempo (http://www.gramaticadomundo.com/2010/10/encruzilhada-os-proximos-anos-do-resto.html).
Capa de jornal de Goiânia
no dia seguinte ao desfile de
7 de setembro de 1981, durante
a maior greve estudantil
das universidades.
Mas não abdiquei em nenhum momento de assumir minha condição de marxista, adquirida nessas três décadas. Da mesma maneira sempre me mantive ideologicamente identificado com o único partido que militei por todos esses anos. Mas concluí, pelas razões expostas no artigo que cito anteriormente, que meu tempo de dedicação partidária já se encerrara. E repito uma frase, que uso no título desta postagem, de Paulinho da Viola, a reforçar isso: “Meu tempo é hoje, eu não vivo no passado, o passado vive em mim”.
Ao mesmo tempo procurei ser mais tolerante com aqueles que divergem de mim, bem como procuro encontrar em outros partidos que têm vieses progressistas outros elementos que complementem minha compreensão acerca da política, no Brasil e no mundo. Procurei me despir dos sectarismos que caracterizaram meu comportamento por muito tempo, e me aproximei de alguns dos antigos adversários, mantendo até mesmo relações de amizades com alguns. Claro, isso só é possível quando há reciprocidade.
Reaproximei-me também daqueles velhos companheiros que haviam se afastado e tomaram outros rumos políticos, e por certo tempo imaginávamos terem traídos seus ideais. Alguns bons amigos, com quem discuto sem problemas mesmo assuntos que divergimos ideologicamente. Sabemos manter a amizade num patamar que não seja estremecido pelas divergências.
Adquiri, assim, uma independência que me permite certas interpretações sem ter que forçosamente me preocupar com um possível centralismo partidário que venha a impor limites nas minhas análises. Como já disse anteriormente, de certa maneira inspirado em Milton Santos, que se tornou para mim uma importante referencia intelectual.
Mas quando não há rupturas ideológicas algumas vinculações antigas tendem a ser mantidas. Assim como também as relações pessoais, pelo fato de termos construídos uma história de embates políticos, de convivermos em momentos de dificuldades políticas, em situações completamente opostas ao que vivenciamos nos dias de hoje. E sabemos, por nós mesmos, que somos partes responsáveis por essas transformações.
Foi por isso que pincei a frase de Paulinho da Viola. Esse passado vive em mim. Não tenho como negá-lo e não o renego, pelo contrário. Foram momentos ricos em minha formação política, em que pude compreender toda a lógica que movimenta a sociedade, as lutas cotidianas em um claro embate de classes sociais, os interesses políticos que motivam até mesmo as guerras. Mas honestidade é um componente de minha vida herdado pelos ensinamentos de meus pais. Assim como o caráter, nós adquirimos isso em nossa família. Mas aperfeiçoamos ao longo de nossas vidas, claro, dependendo de qual meio escolhemos para estabelecer nossas convivências sociais.
Quanto a isso minha militância política só veio reforçar. Mesmo com todas as divergências naturais no embate político, inclusive internamente ao partido que escolhemos, lutamos bravamente ao tempo em que reforçávamos nossos valores, fundados na crença de construir uma sociedade livre dos vícios do capitalismo. Muito embora na prática isso não tenha sido possível onde o socialismo se estabeleceu. O que não significa que não devamos continuar a acreditar que é possível construir uma alternativa que dê conta de superar os erros do sistema capitalista.
Com Renato Rabelo, ex-presidente do
PCdoB, em sessão de autógrafo do
lançamento da segunda edição do livro
da Guerrilha do Araguaia
Tenho a honra de pertencer a um partido que por todo esse tempo demonstrou na prática uma coerência com todo um discurso que vê na política uma condição necessária para transformarmos a sociedade, sempre tendo como objetivo criar condições para reduzir as desigualdades sociais. Não se verá, em nenhum momento de sua trajetória, algo que desabone seus princípios e valores, a ética e a moral que o conduz. É evidente que podem ocorrer casos isolados, quase sempre motivados pela ambição político-eleitoral, mas que não pode ser generalizado e a responsabilidade deve ser individualizada. É difícil conter a ambição humana. Ela só não pode macular todo um coletivo.
Mas a grande política é um jogo bruto. Os que se submetem à rotina estressante de segui-la, claro, podem ser beneficiados por poderem chegar ao poder, mas isso a um custo extremamente elevado. Na medida em que essa disputa constitui-se em um vale-tudo, principalmente quando ideologias radicais se enfrentam, todos os mecanismos para destruir o adversário são utilizados, implacavelmente.
Obviamente essa não é nenhuma novidade, e assim funciona desde a antiguidade. Na literatura marxista, que nos habituamos a ler e compreender, esse jogo é facilmente decifrado quando se sabe quais objetivos estão sendo disputados. Entendemos isso no âmbito da teoria da luta de classes. Mas eu creio que nos tempos atuais, embora seja fundamental continuarmos lendo o velho Marx, e Engels, naturalmente, suas obras não dão conta de nos ajudar a entender a maneira como nas sociedades contemporâneas, muito mais do que em qualquer outra época, os indivíduos são facilmente manipulados e assimilam numa rapidez impressionante os valores que são transmitidos pelos meios de comunicação.
Karl Marx e Michel Foucault
Creio que podemos buscar um pouco desse entendimento em Michel Foucault, que procura analisar o comportamento das sociedades modernas pelos mecanismos de controle, através das várias instituições que compõem a estrutura do Estado. Não são necessariamente instituições do Estado, mas também aquelas que vão surgindo para possibilitar as várias formas de controle, e quase todas elas servindo aos interesses daquela classe que detém a riqueza.
Mas não somente isso, para fugir da simplificação. A ideologia, através desses instrumentos, vai criando opiniões que pelas forças deles se disseminam por toda a sociedade e se constitui majoritariamente, na forma de pensar e agir das pessoas.
As notícias passam a ser produzidas não somente com o intuito de informar as pessoas, mas de criar opiniões e transformar versões em fatos, de acordo com os interesses políticos em disputa. Aqueles que fazem parte da política estão sujeitos a qualquer momento a serem defenestrados, atendendo aos interesses em jogo. E nesse campo não há honra nem verdade, o que importa é a imolação a fim de os objetivos políticos serem alcançados.
Entram nesse mundo de modernidade acelerada as redes sociais. Nelas as notícias se difundem muito mais rapidamente, e pela característica da própria sociedade, de seus mecanismos, elas reproduzem fielmente os objetivos desejados pela ideologia dominante. O julgamento é implacável, num momento em que se generalizam acusações sobre os que participam da política e da estrutura do Estado.
Como no fiel estilo das caças as bruxas, que levou à morte milhares de mulheres inocentes na idade média, ou das neuroses dos regimes totalitários que sempre criaram inimigos e os condenaram por suas idéias, forjando situações que os incriminavam, e no exemplo sempre lembrado do macartismo, que nos EUA abriu uma ferrenha perseguição às pessoas em um anticomunismo que marcou a guerra fria, ou aos chamados dissidentes na antiga URSS, enviados para o frio gélido da Sibéria Assim como aqui no Brasil, com o uso da famigerada Lei de Segurança Nacional.
Em vários desses casos, pouco importa a verdade, ou a necessidade de se apresentar provas concretas. Basta a acusação, mesmo que ela possa ser forjada para atender a interesses escusos, ou mesmo à vingança. Nas redes sociais essas acusações são disseminadas numa ferocidade incrível, e com comportamentos raivosos que partem tanto de pessoas que não possuem nenhuma afinidade com a política, como por aqueles que possuem divergências ideológicas e se aproveitam de forma oportunista das acusações para destruir o adversário.
Tanto em um caso, quanto em outro, o que menos há é a tão propalada ética, aparentemente presente nas indignações. Por vias transversais essas pessoas agem de formas desonestas e antiéticas, embora aparentemente estejam defendendo honestidade e ética, na medida em que podem destruir a honra de uma pessoa, transformando-a em marginal sem que seja apresentada nenhuma comprovação real. O jogo sujo da política emporcalha toda a rede, através de manifestações inquisidoras, de acusadores que não buscam a verdade, mas simplesmente a imolação de quem está prestes a ser queimado na fogueira da inquisição.
Além do mais, sou ferrenho adversário dessa prática de acusar a quem quer que seja indistintamente, e principalmente quando se aproveitam desse tipo de denúncias para atacar quem tem idéias políticas divergentes. A presunção da culpa é típica dos regimes fascistas, que sempre utilizou desses artifícios para condenar seus adversários. Prática já de certo tempo adotada pela grande imprensa em nosso país. Acentuado com a eleição de Lula, este, então, tratado com extremo desprezo e preconceito e até acusado de ser chefe de quadrilha. Felizmente, a maior parte de seus acusadores foi vergonhosamente derrotada nas urnas.
Quanto às redes sociais, embora sejam instrumentos espetaculares que aproximam as pessoas, elas constituem-se também em palcos onde tudo pode ser dito, sem que as consequências sejam medidas. Ataca-se a acusa-se gratuitamente a qualquer desafeto levando a um efeito comum às multidões, difundindo-se uma espécie de linchamento público, acirrado pela grande mídia, sem que as pessoas muitas vezes sequer saibam de alguma prova que incrimine a quem se está acusando. Somente denúncias, quase todas claramente feitas por objetivos políticos. Essa prática foi denunciada no ano passado pela juventude comunista colombiana, quando fraudes e montagens visavam atingir suas principais lideranças.
Repete-se, por meios altamente sofisticados em tecnologia, costumes que eram comuns na antiguidade com os escravos sendo submetidos à multidão sequiosa por sangue, e na idade média, onde enforcamentos e mortes nas fogueiras constituíam-se em divertimentos públicos.
Não nego que a vigilância deve ser permanente sobre o gestor público, e que todas as suspeitas devam ser investigadas. Mas nenhum governo pode ficar refém de acusações que podem ser meros instrumentos vingativos por alguém que está sendo investigado por desvios de recursos (como no caso do indivíduo que acusa o ministro do Esporte). Isso se torna uma armadilha principalmente para quem é honesto e não queira se submeter a chantagens. Mas, é inadmissível que a presunção de inocência, instrumento fundamental em um Estado de Direito seja relegado e desdenhado. Isso pode se constituir em precedente perigoso, deixando em mãos alheias os destinos das pessoas, de forma caótica e aleatória. Isso é um grande passo para o fascismo.
Essa polêmica tem reascendido minha verve político-ideológica acentuando a minha indignação com os rumos pelos quais a cultura na sociedade capitalista tem conduzido as pessoas para comportamentos intolerantes. São vários os fatores que tenho analisado aqui nesse blog. Isso me leva a bater de frente com atitudes que banalizam e menosprezam o outro. Isso, claro, reforça minhas concepções ideológicas, e fortalecem ainda mais minha disposição de seguir em frente na condição de “guerrilheiro cibernético”. Não para atingir ninguém, mas para levantar contradições que muitas vezes passam despercebidas quando não se olham as relações sociais dialeticamente. Portanto, aguardem sempre um texto polêmico, num blog que não silencia para as injustiças. É o que sempre procuro oferecer em Gramática do Mundo. Esse, além de polêmico, é uma espécie de desabafo. Mas não é o único.
Para não perder o hábito, indico para complementar essa discussão três filmes: Culpado por Suspeita; As Bruxas de Salém; Boa Noite e Boa Sorte. Abaixo incluo as fichas de cada filme.


SINOPSES:
1. CULPADO POR SUSPEITA
Anos 50. Umas das mais aterrorizantes épocas da história americana, onde a sociedade, mergulhada no terror, vive seus dias de medo. Na caça de comunistas, o governo americano impõem a lei da denúncia. Uma mera suspeita é suficiente para implicar, em alguém, a culpa. Vivendo nesse meio, está David Merril (Robert De Niro), um famoso diretor de cinema que se nega a denunciar colegas comunistas. Incluído na "lista negra", tem sua promissora carreira interrompida.  Abandonado pelos amigos, passa a contar somente com a ajuda de sua ex-esposa Ruth (Annette Bening). Ao lado dela, enfrentará o Comitê do Governo.
DIREÇÃO: Irwin Winkler

2.  AS BRUXAS DE SALÉM
Em Salem, Massachusetts, 1692, algumas jovens fazem "feitiços". Uma delas, Abigail Williams (Winona Ryder), tinha se envolvido com John Proctor (Daniel Day-Lewis), um fazendeiro casado, quando trabalhou para ele, mas após o fim do caso foi despedida. Assim, desejava a morte de Elizabeth Proctor (Joan Allen), a esposa deste. Elas são descobertas no seu "ritual" e, acusadas de bruxaria, provocam uma histeria coletiva que atinge várias pessoas, sendo que Abby, a jovem desprezada por John, faz várias acusações até ver Elizabeth ser atingida.
COM: Daniel Day-Lewis e Winona Ryder
DIREÇÃO: Nicholas Hytner


3. BOA NOITE E BOA SORTE
Os embates entre o âncora da rede CBS Edward R. Murrow e o polêmico senador Joseph McCarthy ajudaram a derrubar o político. Ele foi responsável pela infame operação de “caça às bruxas”, que acabou acusando, sem provas, vários cidadãos americanos de serem comunistas, nos anos 50.
COM: George Clooney, Robert Downey Jr., Jeff Daniels, Frank Langela
DIREÇÃO: George Clooney
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* Texto revisto e atualizado em 27 de outubro de 2015

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

MADE IN USA: COMO FABRICAR GUERRAS PARA CONTORNAR CRISES

“Por que o cão balança o rabo?
Porque o cão é mais esperto do que o rabo.
Se o rabo fosse mais esperto, balançaria o cão”.

Os Estados Unidos inegavelmente constitui-se na maior potência militar do planeta. Isso o torna, ainda por várias décadas, capaz de ameaçar e intimidar a maioria dos países. Embora sempre exista algum governante mais ousado, a testar sua capacidade bélica, é improvável que optando por fazer uma guerra ele venha a ser derrotado em função dessa capacidade. Mas, como ocorre em duas das guerras das quais ele está à frente, no Iraque e no Afeganistão, suas derrotas podem ocorrer nas estratégias e táticas adotadas. Em função, principalmente, da capacidade de resistência de grupos insurgentes guerrilheiros.
Seguramente a crise econômica atual, tem suas raízes também nos gastos militares absurdos, condição para manter uma estrutura bélica espalhada por todos os continentes, bem como a manutenção dos atuais fronts de batalhas citados.
Mas a guerra, enquanto um componente importante da política, é a continuidade desta por meios violentos, como dizia o teórico e estrategista Carl Von Clauzewitz (Da Guerra, Ed. UnB), tem servido não somente para dominar territórios ricos em fontes energéticas ou de localizações estratégicas importantes. A guerra é também um instrumento para desviar o foco de crises eventuais, seja de governos (política) ou por problemas econômicos.
Quando na semana passada ouvi a notícia da descoberta de um mirabolante plano, envolvendo o governo do Irã e um marginal de um cartel de drogas (apresentado como um informante da CIA), pressenti cheiro de fumaça no ar. A armação, a meu ver, era nítida, por vários elementos que não  analisarei aprofundadamente, mas indicarei alguns artigos que fazem isso. E me chamou a atenção, mais uma vez, o fato disso se dar num momento crucial da crise econômica, nos Estados Unidos e na Europa, antecedendo a uma marcha que envolveria dezenas de países, inclusive os EUA, denominada de “Marcha dos Indignados”, contra o sistema financeiro mundial, o capitalismo e a absurda concentração de riquezas naquele país e em todo o mundo.
geopolíticadopetroleo.wordpress.com
Imediatamente lembrei-me de um filme que eu havia assistido tempos atrás e corri para a locadora, a fim de relembrar-me da trama armada para desviar a opinião pública de um escândalo envolvendo o presidente dos Estados Unidos. Embora ficção, o roteiro apresenta relação entre a história e o tema do filme, citando, por exemplo uma ação estadunidense contra um país centroamericano, situado no Caribe. No ano de 1983 os Estados Unidos invadiram Granada, depuseram e prenderam o então primeiro-ministro Bernard Coard, após um golpe deste contra o anterior, Maurice Bishop. Por trás disso tudo disputas geopolíticas envolvendo Cuba e URSS. A operação, que durou pouco mais de dois meses, teve o sugestivo nome de “Fúria Urgente”.
A citação é feita no transcurso de uma discussão entre um “marqueteiro”, chamado para ajudar o governo a sair de uma enrascada que seria explorada pela mídia num período pré-eleitoral, e um produtor de cinema, contratado para preparar uma encenação espetacular para desviar as atenções da mídia e da opinião pública. A invasão daquele país, embora eminente, teria sido planejada às pressas para desviar a atenção do atentado em Beirute, algumas semanas antes, que culminou com a morte de 241 fuzileiros dos Estados Unidos.
O nome do filme é “Mera Coincidência”(*), título em português  que não apresenta nenhuma semelhança com o original: “Wag the dog”. Mas é aí, no título original, que está a relação com a frase que cito na introdução desse artigo, e que foi extraída dos créditos iniciais do filme. Refere-se exatamente à esperteza utilizada pelos que, na política, possuem os mecanismos para criar fatos e gerar a tão propalada “opinião pública”, que nada mais vem a ser do que as estratégias adotadas entre dois poderes, ou seja, o poder político e o midiático. Seja por meio de uma notícia burlesca, facilmente assimilada por uma mídia atraída pelo sensacionalismo, ou mesmo pelo controle direto dos meios de comunicação, que fazem o jogo da manipulação de forma consciente, por questões ideológicas.
Certamente a distribuidora do filme no Brasil buscou outros elementos do enredo para traduzir o título. Porque o escândalo que irromperia a mídia e corria o risco de causar um estrago na campanha eleitoral do atual presidente dos EUA teria sido um assédio sexual, cometido por essa autoridade que teria abusado de uma estudante no salão oval da Casa Branca. Embora produzido antes do caso Mônica Lewinsk, o filme foi lançado no Brasil posteriormente a esse fato. Ressalte-se que anos antes, mesmo durante a campanha eleitoral, Bill Clinton já havia sido acusado de assédio sexual.
Para desatar esse nó, que poderia levar à derrota do então presidente – agora me refiro ao enredo do filme – esses dois personagens, o marqueteiro e o produtor de filmes de Hollywood, bolam uma história mirabolante:  deflagração de uma guerra contra a Albânia, em função da ação de grupos terroristas naquele país, e que ameaçavam a integridade dos Estados Unidos (os fantasmas de sempre).
A justificativa para a escolha da Albânia é hilária, mas sintetiza o menosprezo que há na política externa dos Estados Unidos com a população de alguns países, notadamente aqueles mais pobres. “Por que a Albania?” pergunta a assessora ao marqueteiro. “O que você sabe sobre eles? Você conhece algum deles? Parecem instáveis, encrenqueiros... Você conhece alguns albaneses? Quem confia neles?”
Assim, a Albania é momentaneamente alçada à condição de centro do terrorismo internacional, e além dos perigosos terroristas poderia estar sendo preparada uma bomba nuclear. Aí, parodiando o título em português, não é uma mera coincidência. Para completar a ironia recai também sobre a capacidade do povo americano (sic) de se indignar. “Quem vai resmungar? O povo americano? O que viram da guerra do golfo? Só o bombardeio a um prédio. Poderia ser uma maquete”.
Parte-se então para a montagem de cenas produzidas em estúdio que pudesse ser apresentada à população como sendo uma guerra. Todos os elementos são explorados, como num filme, para chocar, emocionar e revoltar. E assim é feito. Uma guerra virtual com todos os seus componentes apresentados como se fosse real. Aos poucos, utilizando da estratégia da manipulação da informação, a população vai esquecendo-se das notícias do escândalo e quando começa a haver questionamento da existência real da guerra seus roteiristas confundem mais ainda a população com a criação de um falso herói. Um combatente que teria ficado detido nas mãos do inimigo. Mediante o uso de certos simbolismos esse herói é construído, sem existir, e comove a opinião pública. Não vou entrar em mais detalhes para não contar partes interessantes e surpreendentes do filme, para que os leitores do blog possam assisti-lo. Mas cito um detalhe importante: o elenco é de primeira.
Enfim, esses fatos, tanto o filme que não reflete propriamente um absurdo, como a notícia envolvendo uma trama internacional gerada pelo governo iraniano, são roteiros de uma mesma lógica estratégica adotada desde há muito pelos Estados Unidos. Embora não somente por este país.
No caso do Irã, isso se repete desde a revolução dos Ayatollahs, ou dos turbantes, que derrubou o Xá Reza Pahlevi, então aliado dos EUA. Mas potencializado desde que se descobriram as movimentações iranianas para adquirir a capacidade de enriquecer urânio, meio caminho andado para produzir bombas nucleares. Juntem-se a isso os interesses geopolíticos que opõe, na região do Oriente Médio, Israel de um lado e Arábia Saudita do outro, com objetivos semelhantes, derrotar os xiitas islâmicos que estão à frente do governo iraniano.
Sintomaticamente, na notícia, aparentemente fabricada, o plano seria para assassinar o embaixador saudita em Washington. E, naturalmente, a reação dos representantes da Casa de Saud, foi imediatamente intempestiva, cobrando explicações do governo iraniano, porque supostamente envolvia a guarda republicana daquele país. Aliás, esta sempre envolta em polêmica porque está diretamente ligada ao conselho dos Ayatollahs, não necessariamente subordinadas ao presidente Marmud Ahmadinejad.
Tudo parece ser mais uma grande farsa das agências de espionagem estadunidense. Mas desta vez, ao que tudo indica, não emplacará como uma informação passível de permitir uma reação bélica, apesar de acirrar os ânimos dos países citados, à espera de uma chance para deflagrarem uma guerra contra o Irã. Apesar dos discursos beligerantes e surpreendentemente radicais nessa questão, tanto do presidente Barack Obama, quanto, principalmente, da Secretária de Estado, Hilary Clinton.
Não vou entrar mais a fundo nessa análise porque li recentemente dois artigos que dão conta de explicar as tramas por trás dessa suspeita notícia e cito-os aqui para o leitor do blog. O artigo de Clóvis Rossi (http://www1.folha.uol.com.br/colunas/clovisrossi/991104-a-mal-contada-historia-do-complo.shtml), na Folha de São Paulo deste domingo (16/10) e o artigo de Pepe Escobar, no site Carta Maior (http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=18692).
Não pretendo também aqui neste texto entrar na análise sobre o regime iraniano. Espero poder em breve, assim como fiz em relação aos demais países do Oriente Médio envolto em revoltas, escrever um artigo abordando a importância geopolítica do Irã, suas complicadas fronteiras e as divergências com Israel e com a Arábia Saudita, estas ainda não inteiramente explicitadas, mas insufladas nos bastidores pelos Estados Unidos.
Farei também uma abordagem do regime iraniano e as absurdas restrições às liberdades individuais, principalmente em relação às mulheres, impostas pela rigidez com que os ayatollahs interpretam o Alcorão. E na oportunidade farei também uma comparação com a Arábia Saudita, identificando as razões porque essas mesmas restrições não são alvos da indignação ocidental, em comparação com as tentativas de demonização das ações iranianas, embora devessem ser semelhantes às da monarquia saudita, que impõe medidas semelhantes e, ao contrário do Irã, sequer existem eleições democráticas. Também já nem sei dizer qual o sentido de democracia, em função de determinadas eleições, tanto lá quanto no ocidente, já que fraudes e o poder do dinheiro são determinantes.
O que quero com essa postagem é exatamente abordar um dos elementos centrais que me motivou a criação deste blog, desconstruir certas informações, plantadas na mídia para desviar as atenções das pessoas de situações mais graves em curso, ou até mesmo justificar ações belicistas.
No caso citado, a abordagem que faço decorre de uma análise pessoal. Considero que o crescimento da crise econômica e o aumento da gravidade da situação nos Estados Unidos, aliado a um movimento popular que começa a incomodar com a ação do “Occupy Wall Street” é o elemento motivador. Não por acaso, segundo minhas convicções, a notícia do suposto plano para assassinar o embaixador saudita foi divulgado poucos dias antes das grandes manifestações programadas para um dia de jornadas de protestos em todo o mundo, denominado “United for Global Change”.
Essas manifestações, ocorridas no dia 15 de outubro, e que mobilizaram manifestantes por 83 países do mundo, não focam somente no ataque á crise econômica, mas também à própria lógica gananciosa do sistema que criou uma disparidade absurda, onde 1% das pessoas controlam mais de 50% da riqueza mundial. São críticas ao sistema financeiro, às grandes corporações e ao capitalismo. 
Em alguns países, como na Itália, a população radicalizou nos protestos, acontecendo muitos confrontos policiais num ato que reuniu mais de 200 mil pessoas. A manifestação aconteceu também em mais de 900 cidades, irradiada a partir de Wall Street, em algo inédito na crítica à maneira desigual como funciona o sistema capitalista e só comparável às manifestações pela paz às vésperas da segunda guerra ao Iraque, em 2003.
São situações que marcam uma conjuntura complexa, e uma realidade mundial de conseqüências imprevisíveis. Do que posso imaginar, pelo que acompanho pela história e nas análises geopolíticas, poucas conclusões me restam além de acreditar na possibilidade de as potências mundiais em crise criarem uma situação de beligerância, que possa levar restrições justificadas por uma necessária economia de guerra.
Ou seja, avalio como de difícil solução a atual crise, na medida em que um verdadeiro nó górdio foi dado nas finanças mundiais com as sucessivas quebradeiras de grandes bancos e a impossibilidade de os Estados arcarem com isso. Restando a guerra, como já aconteceu em outras épocas, para que as grandes potências possam retomar o controle da economia e as corporações possam lucrar com as reconstruções do pós-guerra. Isso justificaria o ataque ao tesouro de alguns países, que na periferia caminham a passos largos para superar a hegemonia que até agora se encontra nas mãos dos Estados Unidos e de alguns de seus aliados estratégicos na Europa.
São dúvidas, questionamentos, apoiados na realidade do presente e no que a história conta do passado. Prever o que pode acontecer é um exercício profético, não tem bases científicas, mas, da mesma maneira como se tentou criar uma guerra a partir de uma montagem hollywoodiana, como no filme citado, também exercito, quem sabe, uma capacidade roteirista, para imaginar uma guerra sendo preparada para cumprir a sina gananciosa dos que detém o poder hegemônico mundial. Pelo menos até agora. E se isso acontecer, teremos forças para impedir?


(*) Ficha do filme:
Título no Brasil:  Mera Coincidência
Título Original:  Wag the Dog
País de Origem:  EUA
Gênero:  Comédia
Tempo de Duração: 97 minutos
Ano de Lançamento:  1997
Direção:  Barry Levinson
Elenco:
Dustin Hoffman ... Stanley Motss
Robert De Niro ... Conrad Brean
Anne Heche ... Winifred Ames
Willie Nelson ... Johnny Dean
Kirsten Dunst ... Tracy Lime
Woody Harrelson ... Sergeant William Schumann

domingo, 9 de outubro de 2011

“A VOLTA DO CIPÓ DE AROEIRA NO LOMBO DE QUEM MANDOU DAR”

"Vim de longe vou mais longe, quem tem fé vai me esperar,
Escrevendo numa conta, prá junto a gente cobrar,
No dia que já vem vindo, que esse mundo vai virar”
AROEIRA – Geraldo Vandré (1967)

Esses versos, marcantes, de alguém que perdeu aquela sintonia por causa dos “anos de chumbos”, servem muito bem para ilustrar as mudanças que aconteceram no mundo nas três últimas décadas.
Geraldo Vandré, no auge dos protestos contra o regime militar, compôs músicas inesquecíveis para os que viveram intensamente aqueles anos marcados pela ideologização à flor da pele. Era visível, nítida, expunha-se a luta de classes em toda a sua realidade.
Claro, nem todos viviam tendo as referências políticas, e as ideologias que se digladiavam no mundo da guerra fria. A maioria, aliás, desconhecia quase que por completo toda a guerra que se desencadeava ao seu redor. A alienação era também marcante, imposta não somente aqui no Brasil, por ser uma ditadura militar, mas também, por exemplo, nos Estados Unidos, onde a manifestação de simpatia ao socialismo, ou à União Soviética, era passível de punição. Desde exílio até a acusação de traição, tudo isso expresso no movimento denominado “macartismo”, alusão ao senador que aprovou uma lei que definia como crime a opinião e a simpatia por outro sistema que não o capitalismo.
Aqui a censura era brutal, e nas ruas a juventude batia-se corajosamente contra as crueldades e torturas de um país que vivia sob uma legislação fascista, baseada numa malfadada Lei de Segurança Nacional. A esperança de transformação social, naquele momento, era majoritariamente apegada à necessidade de uma revolução, inspirados que estavam os que divergiam dos militares, nas experiências revolucionárias chinesas, cubana e da vitória do Vietnã com a conseqüente derrota estadunidense.
O fracasso das ditaduras militares, que começam a ruir no final da década de 1970 e consolidam a decadência por meados da década de 1980, traziam a esperança de que uma mudança política e social abriria espaço para que o socialismo se tornasse uma alternativa concreta na América Latina.
O movimento social voltou com todas as forças e se impulsionou celeremente com a crise econômica que atingiu todo o mundo no final da década de 70. Foi a chamada crise do petróleo, poucos anos depois que os países produtores de petróleo criaram a OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), em 1961 e estabeleceram reajustes elevados, sob o argumento que o preço do produto estava próximo aos custos de produção.
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O ápice dessa crise ocorre entre três conflitos no Oriente Médio, a guerra de Israel com os países árabes (1967 e 1973), a revolução iraniana (1979) e a guerra Irã-Iraque (1980). Além do fato de a aceleração do consumo afetar as principais reservas, acendendo uma luz vermelha para o risco de uma crescente escassez do produto.
O Brasil, cujo crescimento no período do chamado “milagre econômico” se dera à custa de um enorme endividamento externo, entrou em uma profunda crise econômica. Escondida o quanto foi possível pela manipulação dos índices e pelo controle quase que total da mídia. Restavam as vozes marcantes, mas de alcance limitado, dos jornais da chamada imprensa alternativa, que denunciavam com vigor as condições de decadência que vivia o nosso país.
Os anos 1980 refletiram os impactos gerados por essa crise. Desmoralizados, os militares gradativamente foram sendo condenados pela opinião pública, em movimentos que passaram a exigir eleições diretas e o fim das restrições políticas. Sem mais forças para suportar as pressões que vinham da rua, aliado com os rombos crescentes nas finanças do Estado e os aumentos exorbitantes do endividamento externo e interno, eles entregaram a contragosto o poder.
Mas a passagem do poder para as mãos civis, bem como a abertura, embora lenta, e o fim das perseguições políticas, não seriam suficientes para garantir que o país pudesse viver a sua “primavera”. Também isso acontecia em outros países latino-americanos. O que se conseguiu na transição política, embora através de eleições livres (apesar de restrições naturais na lógica da democracia capitalista), foi a ascensão de políticos conservadores.
Como no resto do mundo também as conseqüências econômicas decorriam dos problemas gerados pela crise do petróleo, o que se viu foram governos eleitos para administrar um enorme rombo nas contas públicas. E o endividamento externo fazia com que novos empréstimos a serem concedidos pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), viessem acompanhados de obrigações e compromissos firmados pelos governos que dependiam deles, e impunham fortes restrições aos investimentos do Estado, principalmente em programas sociais que pudessem reduzir as desigualdades.
Aproveitando-se da grave crise financeira que estrangulava os Estados latino-americanos, e de praticamente todos aqueles que haviam se endividado na década de 80, os países imperialistas passaram a impor determinadas políticas, executadas através dos chamados “organismos internacionais”, vinculando os possíveis empréstimos mediante a adoção de políticas desconcentracionistas, desregulamentando a economia.
Esses palavrões poderiam ser traduzidos simplesmente como a necessidade de não mais os Estados Nacionais imporem restrições à livre circulação de mercadorias, ao controle do capital financeiro e ao livre funcionamento do mercado. Assim, mediante essas políticas que passaram a ser chamadas de neoliberais, e para poder contrair esses empréstimos a fim de cobrirem os rombos e conter a escalada inflacionária, os Estados reduziram drasticamente seus investimentos, terceirizaram serviços e deixaram de financiar setores imprescindíveis para um crescimento nacional autônomo e independente.
Para países como os da América Latina a década de 80 tornou-se conhecida como a “década perdida”, mas pelo mundo adentro a farra era outra. Com os mercados livres e as economias dos países desregulamentadas as grandes corporações deleitaram-se e lambuzaram-se com o dinheiro alheio. Real ou virtual. Às custas de roubos astronômicos, nos processos escandalosos de privatizações de grandes empresas estatais, vendidas a preço de banana, essas corporações passaram a concentrar cada vez mais poder, atuando em todas os setores vistos como estratégicos dentro de suas lógicas ambiciosas e gananciosas de ampliarem seus lucros indefinidamente. Não importando se as conseqüências eram o aumento das desigualdades sociais e da usura
A concorrência foi sendo gradativamente eliminada pelas sucessivas fusões de grandes gigantes que competiam entre si, mas que a partir de então, com a junção de suas marcas, essa competição limitava-se a um grande engodo de marketing, na medida em que o apresentado aos consumidores representava na verdade uma disputa ao estilo do velho “telecath”  ou aquela luta livre que nos divertia nos anos 70 mas que não passavam de grandes encenações. Afinal, os lucros dessas grandes disputas concorrenciais entre grandes marcas terminam por serem depositadas nas contas dos acionistas de uma mesma corporação.
Assim, a concentração do capital aumentou exponencialmente nas mãos de poucos elementos da burguesia, um número ínfimo de famílias, cada vez unindo-se mais entre elas como uma necessidade para que essa riqueza não se dispersasse. Para que não se detectasse essa forte contradição, de um mundo estagnado economicamente, e de um aumento da riqueza nas mãos de poucos, alguns intelectuais foram convocados a explicar o que ocorria no mundo.
Aproveitando-se da crise que atingiu o socialismo no final dos anos 80, também essa decorrente das conseqüências dos problemas advindos da década anterior, portanto teve a ver também com a crise da economia de mercado, além dos problemas antigos da concentração do poder do Estado e das limitações dos avanços tecnológicos, difundiu-se amplamente a tese do fim de tudo. Evidentemente tudo que dizia respeito à identificação de injustiças sociais como decorrentes do capitalismo e da concentração de riqueza.
Teóricos correram o mundo, e mesmo aqui em nossas universidades não faltaram “expertises” que retiraram seus paletós do fundo do baú e se apresentaram como coveiros de uma era, e afirmavam o capitalismo como único sistema escolhido a tornar-se infinito, ou até que a humanidade sucumbisse às suas extraordinárias mudanças tecnológicas que deslumbravam exploradores e alienados. Aqueles em números percentuais cada vez menores, estes sempre crescentes e bem mais acomodados aos desígnios divinos que os confortavam diante da possibilidade de, pelo trabalho, e com a força dos céus, poderem ascender a patamares superiores.
Mas não se falava das classes sociais. Até mesmo alguns sociólogos se encarregaram de enterrá-las. Consumou-se, diziam com a autoridade de boquirrotos, que não mais havia luta de classes. Também morrera a ideologia, alegremente enterrada por reacionários que não abriam mão dela, sorrateiramente. Enfim, conseguiram até mesmo difundir largamente a idéia do fim da História. Só sobrava (o cacófato faz sentido) o capitalismo, e teríamos que conviver com ele, com as imposições unilaterais dos Estados Unidos e com a certidão de legalidade da usura, ganância, corrupção, desvios de moral e a pobreza crescente da maioria da população mundial.
Mas, como profetizou Vandré, aos poucos foi se aproximando o dia em que o mundo ia virar. Se um onze de setembro em 1973, no Palácio de La Moneda, em que um golpe militar e a morte de um presidente, Salvador Allende, abriu espaço para transformar o Chile em cobaia do neoliberalismo; outro onze de setembro, em 2001, com o ataque no coração do império, abriu-se o caminho para a consumação de uma decadência prevista.
Só mesmo os tolos, os que desconhecem a História, imaginam ser eterno o poder de um império. Como tantos outros, que por épocas conseguiram impor seus domínios e assaltar as riquezas dos países mais pobres, também os EUA e as demais potências que com ele e seus instrumentos de controle dominaram e exploraram as demais nações, teriam o momento em que soariam para eles os dobres de finados.
Não se espere, contudo, que o enfraquecimento será acelerado. São nações ricas e poderosas, suas agonias têm mais a ver com a perda de hegemonia, não necessariamente deixarão de fazer parte dos banquetes dos mais ricos.   Mas perderão a condição de impor perante as demais nações suas vontades imperiais, a menos que recorram a uma guerra de proporção mundial, para tentarem reerguer-se das cinzas seguindo-se a lógica macabra do capitalismo de desastre.
Sucumbem, no entanto, diante de circunstâncias criadas por elas próprias, como a confirmar a lição da dialética que afirma ser a negação da negação o elemento fundamental a levar adiante as transformações na vida, na natureza e na sociedade, com base no choque das contradições.
Ver o povo nas ruas, a protestar com veemência contra crise financeira, desemprego, inoperância do Estado em solucionar os problemas econômicos e sociais, fazia parte do cotidiano dos países do chamado terceiro mundo. Nesses, persistem ainda muitas desigualdades, mas o vento mudou de lado. Embora ainda existam insatisfações, desigualdades sociais, lutas de classe visível e presente nas manifestações públicas, já não são somente esses países a conviverem com essa situação.
Espalha-se pelos países ricos centrais, por toda a Europa e nos Estados Unidos, a insatisfação da população pelo desequilíbrio fiscal desses países, contra a concentração de riqueza nas mãos de uma minoria responsável por toda a situação crítica da economia, contra o desemprego crescente, a falta de perspectiva da juventude e a corrupção que afeta todo o sistema político e financeiro. Enfim, todas as pragas escondidas dessa população, e que são como vírus e bactérias que acompanham o capitalismo, se disseminam agora à vontade, diante da baixa imunidade que joga o sistema na unidade de terapia intensiva.
De outro lado, a força que impulsionou toda a expansão das finanças mundiais, modernizou as relações interpessoais e entre as nações, garantiu rapidez na comunicação entre as empresas e facilitou o deslocamento rápido de suas mercadorias, a tecnologia que apontava o capitalismo como vitorioso frente a outro sistema que parou no tempo, voltou-se contra seus criadores. A globalização trouxe os países pobres para o banquete dos ricos.
A internet, e com ela as redes sociais, potencializaram revoltas e facilitaram as comunicações entre aqueles que trocavam entre si opiniões que se disseminavam rapidamente, dando conta de que determinadas situações não são ocorrências do acaso. Aos poucos as pessoas foram tomando coragem e buscaram soltar seus protestos não somente pelos caminhos virtuais. Muito embora elas não consolidem mudanças, porque lhes faltam organicidade. Mas isso não ocorre apenas nesses dois últimos anos, em que se intensificou a crise econômica mundial. Uma grande revolta ocorrida no final da década de 1990, em Seattle, por ocasião da reunião da Organização Mundial do Comércio, já havia sido convocada pela internet, celulares e redes sociais.
Após as rebeliões nos países árabes, e como eu já escrevi em outros textos, isso aconteceu também como decorrência da própria crise que impediu as grandes potências de continuarem mantendo esses regimes ditatoriais e que lhes serviam, essa prática foi se acentuando nos países ricos, onde se anunciavam situações críticas, quebra do sistema financeiro como decorrência de falência de bancos e desemprego gerado por medidas políticas rigorosas para conter o aumento do déficit fiscal.
Grécia, Irlanda, Islândia, Espanha, Portugal, Itália, Inglaterra, França... Agora Estados Unidos, e sabe-se lá quantos mais estarão submetidos à pressão popular de um lado e às dificuldades de darem respostas à falência econômica de seus países. Certamente, ainda teremos muito a escrever sobre o andamento desses conflitos. Eles estão apenas começando e nos dão a impressão de que o século XXI não será diferente do que foram os dois últimos séculos.
Transformações sociais aceleradas e a troca do poder hegemônico entre as grandes potências, ou a substituição delas nesse jogo de xadrez da geopolítica mundial, indicam que o novo século não será o da catástrofe ambiental, como querem alguns para desviar as atenções da podridão capitalista. Mas de uma profunda alteração do poder mundial, com a entrada em cena de nações que por muito tempo foram colocadas na condição de servidão para os países europeus e os Estados Unidos.
O jogo apenas começou. É a volta do cipó de aroeira, no lombo de quem mandou dá!